armadura
quando menina apertava os dedinhos na barra da saia de algodão num canto via as colegas bonitas correndo seus corpos de dente de leão suas levezas sem esforço pelo pátio elas sabiam subir em árvores e pular muros e sabiam dizer as palavras exatas para me derrubarem de lá de cima as palavras pulavam sobre meus ombros quando mulher aperto meus dedos embaixo do casaco e crio forças para enfrentar a beleza hoje saio do canto com os ombros tensos para não cair e crio meus pátios acima das árvores e fora dos muros também sou leveza recolhi do chão os ninhos caídos as sementes expostas e dentro de mim habita uma ave há vinte e poucos anos * bisturi eu não quero saber desses afetos da palavra: leia minha poesia me olhe nos olhos e diga se é boa ou má. não me toque pelos ombros não me imagine despida não tome meu partido em rixas. mas me leia como lê os seus comparsas. com o mesmo cuidado e fundura, talvez calma. sobretudo me leia como quem busca os óculos para examinar um corpo. me leia com as mãos cobertas de álcool em gel. eu não quero saber desses afetos do lado de fora da palavra: atrás da porta, tudo é ruído e espera. se quer me ler, leia como alguém que não goste tanto de mim * recruta tenho recusado os convites para servir a exércitos peço perdão aos amigos mas me doem os braços de tanto vestir seus uniformes me trocar destrocar tenho pedido tréguas e assisto calada às batalhas peço perdão aos amigos pela infidelidade a tantos belicismos que lhes cabem crescem calos dentro das botas e minhas mãos ardem feridas de lixívia removendo as manchas enquanto houver sangue no tecido dos uniformes fico só me lembrando de como suas pátrias se reerguem tão depressa e eu acabo nas trincheiras com os tímpanos explodidos e a boca suspirando o cansaço aberta às formigas
1 Comentário
28/5/2020 18:43:44
fiquei muito feliz com a publicação, meus queridos! muito obrigada! agora eu posso falar que sou uma bacaninha! hahahahah
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Novembro 2021
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