Há coisas que sabem cair
e outras que demoram como se o espaço fosse um arbusto a ser escalado do avesso quando já não há onde segurar (como se o avesso de tudo ainda fosse o mesmo espaço em que o sol estira suas pernas cansadas) Há coisas que caem como se desertassem Há coisas que caem como se ouvissem Debussy Há coisas que caem como um piano sob as mãos de um bebê Chopin cedo demais! tarde demais! gritam as teclas sob os dedos que caem como amoras vermelhas vivas Há coisas que caem como se falassem que tinha de ser assim Olham-nos bem dentro dos olhos enquanto caem para certificarem-se de que as ouvimos bem Por último há coisas que preferem silenciar e caem como se viajassem dentro da noite num comboio vazio * Deixo-me dobrar como um cobertor bom que se guarda na mochila para a hora baixa Deixo-me por às costas bem oculto atrás dos dois pulmões do viajante Ouço como o sangue passa desde a nascente pelo corpo todo Ouço como esconde sua origem a cada passo como é uma só a montanha que me leva até o próximo inverno * A cabeça é sempre a maior parte de um alfinete Com ela o corpo todo pode aterrar-se Pode mesmo existir como se fosse não apenas algo que entremeia Pode ser como uma flor ou uma cereja * Deixo o pensamento vir digo que é bom assim que venha sem rosto apenas pernas escuras como a noite de onde veio Digo que é bom que seja assim fortuito criança sonâmbula sede noturna relevo estreito para o barco do meu afeto Digo que é bom assim que se achegue como um filho que me perdeu numa velha guerra
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Novembro 2021
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