Tabacaria
Foi neste banco que tirámos a prova dos 9 como quem arranca as portas do coração e o entrega à vadiagem dos sentidos. A esse banco, que não pode mais ser este banco, eu torno todos os santos domingos para beber um pouco mais do nosso sangue até secar a língua a ferro. Nos dias de semana, aqueles em que vestimos as peles de cordeiro e mentimos trapaças que de nós façam hábeis asnos, fazes perguntas sobre arquitectura, sobre como levantar um lugar vazio: é mesmo possível erguer paredes e dentro fazer arder corpos? Costumo responder-te, quando me vejo amiúde no banco, ao domingo, que não houve senão ausência a manter viva a chama do cinzeiro a que nos acostumámos a chamar casa. * Glossário I As baratas constroem a noite no subsolo do apartamento, igualmente a (rare)fazem além-tejadilho. Imobilizam-se, e a um determinado estímulo reagem eufóricas, espavoridas. Faça-se, todavia, uma advertência (está na moda e é um por cento das vezes necessária). O perigo é latente: isso das baratas serem tontas deve ser inveja popular, presunção de fazer caber um modelo na frase à deriva, caminho avulso no meio da pedra, a ânsia pisada por uma canção compensatória. Um palmo de pessoa na testa a medir fervuras. Eu acho bem mais eficaz falar do medo para o desviar, fingi-lo oculto debaixo da língua jorrante e eventualmente, em redor do fogo, com os amigos, tropeçar nele e rir, como a literatura ensina. Eu gostava de ser como as baratas (o ódio é o amor selvático na pequena eternidade dos quartos): ágeis no abandono, persistentes na repulsa cadente que vão tecendo pelo caminho fora. II Que significa a viagem? Que no silêncio eu carregue os mortos Que me acompanham. III Se me vens decifrar, mato-te. E, cuidado, que eu sou versada é em torturas.
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Novembro 2021
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