Repetidamente batendo
uma fome que são estrelas a cair na noite não há noite quando te vejo e não faz sentido haver pássaros a esta hora voando sobre a minha cabeça são estrelas a alimentar que prendo que solto quando a minha boca toca os lábios que deixaste desenhados neste lugar quando inundaste o mundo e fugiste e o mundo era todo lágrimas que me queimavam o espelho e eu só queria ter corpo ainda que se sacrificasse para eu o sacrificar e distrair a dor que me faz andar fugir como tu para onde tu estás e eu só queria fugir como tu para onde tu estás do nada cair na palma da tua mão sentir o teu perfume morrer atrás de ti quando passas e eu cego ver-te andar ao longe talvez sorrir ou acenar e morrer. * ouvimos o sabor das nuvens e evocando de uma geração inteira a solidão rendemo-nos e aqui nesta vertigem veloz de estar parado olhando o passado crucificámos todas as memórias. quanto à magia que sentes bebe do mesmo copo que eu e sente o clamor quente desse deus líquido no alvoroço visceral de ser herói sem campa e morrer voando fingindo super-homens atarefados com a coceira dos dias. e aqui gesticulando atrapalhado a cegueira religiosa do fim da noite do inicio da manhã aqui falando entre as palavras que digo aqui neste lugar são sempre mais as memórias que fiz. como se esta embriaguez fosse ouvir melhor com tudo menos com os meus ouvidos e isto é fácil como são fáceis as pessoas que me amam que me escondem a arma do barulho e me tiram a janela dos pés numa proibição rabugenta de velho que me impede à força o estrondo letal do suicídio. e mesmo não esquecendo aquilo que o corpo teima em guardar ficamos parados a ouvir o falcão incandescente da lembrança cantando que o suave toque do teu beijo ao cair da tarde lembra-me a inveja que tenho da liberdade, o silêncio interrompido pelo teu tossir, a esperança que tenho de me acabar para poder partir. Porque aqui são mais as memórias que fiz que a vontade que tenho de me lembrar delas. * Vais sobrevivendo mordazmente aos tambores de ferver na cidade de ferver na cidade DE FERVER NA CIDADE aos tambores dos velhos na janela aos tambores dos olhos dos velhos na janela tacteando com as íris profundas da idade o cinzento cannábico da juventude da praça à meia noite sobrevives deslizas os braços de um lado ao outro da rua fachadas de abrigo porque o mundo não está a cair mas parece inevitável que te caia em cima os teus braços são gigantes as pessoas param a olhar para ti porque tu és de certa forma excepcional, magnífico completamente banal uma autêntica besta o fundo da rua sustenta uma igreja abriga-te e reza ou corre para o carro e tranca as portas desliza os teus braços gigantes no porta moedas procura as chaves do carro as chaves do carro? porque não paraste para rezar? devias ter parado para rezar que o céu assusta-se quando lhe falas e afasta-se de ti a cidade está a ferver as lâmpadas gaseadas explodem num pó de carne picada as chaves do carro, tens de sair daqui o metal que ampara as parabólicas encarna discos voadores de canais e canais e canais de pornografia no vidro da frente do teu carro merda devias ter rezado as chaves do carro! vapores de gasolina o barulho infernal da salvação corre cavalo de rodas corre não há vermelhos tudo é vermelho a cidade arde ferve arde derrete tudo é vermelho não há passadeiras atropela o vento e toda a gente, não há vento tudo é vermelho é a tua casa são os teus amigos sobreviveste é a tua casa eles estão contigo frescos, suaves, do teu tamanho mete-te dentro deles e acalma-te que a cidade nunca há-de penetrar no teu peito por isso não temas um desastre nuclear mas lembra-te sempre do caminho de casa lembra-te sempre do caminho da tua casa. * O som das sirenes como gatos aflitos Caindo, saltando Do parapeito de uma janela Os vasos quietos Casas de crianças de centenas de cores Crescendo para nada mais Que uma sopro do universo Um arfar teimoso De um fim sem sentido Os tubarões de dentes afiados que são As matrizes da lógica Desta cidade De onde se erguem para a lua Dois pequenos cotos ensanguentados Amputados de vontade Que somos nós Eu e tu, Teimosamente vivos, Esperando um pelo outro. * tinha acabado de jantar julgo que naquela noite empadão frio do almoço e bebi um copo de vinho tinto e não lavei a louça nem a arrumei porque estava a dar a bola na tv sentei-me no sofá vazio e a sala transformou-se num retrato escuro da minha sombra embutida na sombra do sofá no centro de uma orla branca e de um espaço negro quando me levantei o retrato da sala escura ficou vazio, só o sofá negro contra a parede branca e percebi que o sofá tinha voltado a ficar vazio e então percebi que estava sozinho em casa e há muito tempo que não ligava aos meus amigos e há muito tempo que não tinha amigos e há muito tempo que não sentia o corpo de uma mulher. lavei a louça e arrumei o prato o garfo e o copo entalei a cadeira na mesa. fiquei parado a observar que a casa toda 5 minúsculos compartimentos era um continente pangeia infinita sorri, abri o gás e fui comprar tabaco voltei com uma puta barata da rua das amendoeiras abri a porta e acendi-lhe um cigarro
1 Comentário
Teresa
21/8/2018 15:42:46
😊
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